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quinta-feira, 14 de outubro de 2004

A história mal contada da Filarmonia

Há histórias mal contadas na extinção da Filarmonia das Beiras. Ora leiam.

Pensem nisto: "houve unanimidade na votação da extinção" da filarmonia. Entre os sócios da Associação tinham que estar 75 por cento dos participantes, caso contrário não poderiam votar o ponto principal da ordem de trabalhos. E estavam. A agenda tinha um ponto específico para a extinção da orquestra. E foi votado por unanimidade.

Acham que a Universidade de Aveiro ia pactuar numa lógica de retirar a orquestra de Aveiro quando foi uma das entidades que mais investiu na sua existência? E Aveiro não tinha um vice-presidente da direcção, mandatado pela Câmara, que é o Vereador da Cultura, Manuel Ferreira Rodrigues?

Claro que as palavras enigmáticas do presidente da Câmara, Alberto Souto, na última assembleia eram estranhas... Mais estranhas ficam quando fiquei a saber isto:

Manuel Ferreira Rodrigues NÃO ESTEVE na reunião que decidiu a extinção da orquestra. E ao que parece não informou o presidente. Ora, quem não está numa assembleia concorda com o que lá foi dito, ou dá ordens e procuração a alguém, não é? Ou impugna se acha que as coisas não foram bem feitas. Ou diz alguma coisa. Agora não ir?

É grave, muito grave, como eu já tinha dito anteriormente. E ainda vamos descobrir mais coisas... Ou o senhor presidente tira o pelouro ao vereador, ou aceita a decisão e não acredita em histórias da carochinha e defende os interesses de Aveiro.

O Público e o Diário de Aveiro de hoje fazem eco das mais recentes noticias sobre a Filarmonia. No Diário de Aveiro, o título afirma a suspeição do momento: o desvio de verbas para outra orquestra. Por outras palavras, a extinção da Filarmonia era resultado de uma manobra para "transportar" as verbas para outra orquestra, a criar em Leiria ou Coimbra...
O Público, pelo seu lado, avança com a questão de ter sido o director executivo da Filarmonia, Virgilio Nogueira, o responsável pela extinção. Estas duas teorias, certas ou erradas, são veiculadas pela Comissão dos Músicos, atacados, devido às suas reivindicações salariais, como os principais responsáveis pela situação "fatal" da orquestra.

Nenhuma das partes conta a história de outra que não a sua forma, mas devemos saber a coerência das suas afirmações. Quando a direcção assume que a orquestra não era viável, estava claramente a falar da lógica empresarial: prever o futuro, sabendo que a ida a tribunal dos quatro músicos iria, provavelmente, criar um rombo financeiro na OFB que levaria à sua falência ou, pelo menos, a uma situação muito pouco estável.
Por outro lado, os músicos jogaram de forma baixa ao colocar o odioso da questão nos salários do director executivo. Como está escrito no Público, "os encargos com os 27 músicos estavam estimados em 433 mil euros. Os encargos com os cinco administrativos e o director artístico atingiam os 200 mil euros. Esta discrepância de valores é posta em evidência quando os músicos revelam que o valor do salário de Virgílio Nogueira subiu de 1250 euros, em 1997, para 3.200 euros, em 2004. E concluem: "Não se compadece este ordenado com a situação económica da orquestra, que, apesar de ter lucros, não possui solvabilidade económica para garantir os contratos de trabalho dos músicos, mas possuiu para manter um ordenado bombástico de alguém que acabou por a levar à destruição, alegando sempre falta de dinheiro, para que os músicos fossem sacrificados em detrimento do seu ordenado"
Ora Virgilio Nogueira não era, em 1997, director executivo da orquestra. Era somente o seu responsável de comunicação. Também não dissem que a orquestra já tinha, desde essas datas, aumentado e diminuido o quadro, o que originou menos pessoas e o aumento de responsabilidades. E também não disseram que estes ordenados são brutos. Um director executivo a ganhar pouco mais de 2500 euros? 500 contos na moeda antiga? Para um trabalho a tempo inteiro?
Já os músicos, segundo os seus números, ganhavam uma média de 1336 euros por mês. É fácil fazer as contas: 433 mil euros, a dividir por 27, a dividir por 12 meses. Por um trabalho semanal de 12 horas. Por um trabalho que, embora de qualidade, não exigia exclusividade. Entendo que seja pouco para os que não tinham outras fontes de rendimento mas e para os que eram professores e davam aulas privadas? Ou concertos? Sei que um dos melhores da orquestra recebia cerca de 2000 euros por mês, por 12 horas de ensaios e concertos...

Eu sou a favor da cultura, mas tenho que acreditar em projectos viáveis. Não sei se a Direcção fez tudo o que podia para aumentar as fontes de receita para o próximo ano e colmatar este problema, mas todos deviam jogar limpo...

4 comentários:

  1. Confesso que li o teu artigo de forma "enviesada" mas deu para perceber pois já tinha lido sobre a filarmónica. Não sei quem tem razão, mas sei que a filarmónica não devia acabar: pelo que representa e pela sua qualidade. Infelizmente não me admira nada que termine e ainda me admira menos que o vereador DA CULTURA se interesse pouco pelo assunto (ele interessar-se-á por quê, já agora alguém sabe?)

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  2. Nao, não me excedi.
    A única forma de comparar trabalho é com dados: o meu horário de trabalho é X horas/semana. Se eu estiver a estudar para melhorar a minha função, isso é louvável mas não conta. Não são suposições, podem perguntar!

    Eu prezo muito os músicos, não entendam mal.

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  3. Mas afinal o que é que é mais grave? O facto da Orquestra das Beiras se extinguir ou a razão pela qual se extinguiu?
    Postas as coisas nestes termos, dá vontade de dizer: estamo-nos bem borrifando para a existência / desistência da orquestra; queremos é ver sangue a jorrar e cabeças a rolar!

    Sobre o trabalho e os salários auferidos pelos músicos, convém de facto, usar de algum comedimento, até porque para lá dos valores, tratava-se, ao que vou sabendo, dum problema de estabilidade: como em tantas outras estruturas, o investimento de cada um dos seus intervenientes é proporcional à estabilidade por si percebida.
    Ninguém vai dar 100%, muito menos 110% daquio que tem para dar a uma instituição que não garante futuro.
    Até porque não estamos a falar de clubes de futebol ou outras plataformas de lançamento de carreiras.

    Mas assusta mesmo (voltando à carga) que se discuta mais a razão da extinção do que a extinção propriamente dita. Que repercussões se adivinham? Ou o trabalho recente da Filarmonia das Beiras era tão mau (não acompanho há uns anos) que o que se extinguiu já não aquece nem arrefece os ânimos culturais das "Beiras"?

    Há ânimos culturais nas "Beiras"?

    PS: A Filarmonia das Beiras começou mal, envolta em disputas caciquistas entre Aveiro, Coimbra e Viseu. Acaba mal, também, provavelmente sem nunca se ter chegado a livrar desse estigma original.

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