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quinta-feira, 24 de junho de 2004
Bandeiras e sentimento nacional
Em resposta a um comentário meu, feito aqui e também no blog Contrafactos e Argumentos o Pedro Fonseca respondeu-me aqui e aproveito para rebater alguns dos argumentos:
- Não achas curioso as bandeiras nacionais aparecerem no mesmo fim-de-semana em que se ia votar para as europeias?...
A questão das bandeiras surgiu muito antes meu caro, pois no inicio da concentração já Scolari apelava às bandeiras nacionais. Mas é verdade que foi ao mesmo tempo da campanha.
- Não achas curioso as bandeiras nacionais aparecerem relacionadas com o futebol mas pedidas por um comentador político?
As bandeiras são claramente pelo futebol só que não foram por um comentador político qualquer: Marcelo Rebelo de Sousa tem um impacto que mais ninguém tem, numa televisão que acerta numa faixa do povo português que mais depressa responde a estes estimulos.
- Não achas curioso tu próprio falares de não misturar as coisas e dares o exemplo dos "movimentos colectivos onde seja facil de entrar e sem custos humanos" como o "branco por timor"?
Não acho curioso porque a minha tese reside exactamente ai: actualmente os cidadãos não se interessam por causas políticas de longo prazo, estruturadas e com definição ideologica. Respondem perante estimulos e reacções. Mais depressa consegues ter respostas positivas e em número significativo a eventos como "assina online a petição"; "manda um email pela XXXX" ou mesmo "vamos à manifestação" ou ainda "coloca lá um pano branco" do que um trabalho de longo prazo que evite essas acções: uma ida a uma assembleia municipal, uma reclamação contra uma câmara por causa de um prédio que vai abaixo e é património", etc. Esta questão das bandeiras entronca ai: fazes um apelo simplista e as pessoas ficam satisfeitas com o seu ego porque estão a apoiar o treinador.
- Não achas curioso um país a querer limpar a alma? Limpá-la de quê?
- Não achas curioso que não tenhas "desmontado" o texto do JVM?
Não queria: era um comentário, não era um texto elaborado.
- Não achas curioso e não és capaz de concordar com este parágrafo de que "A bandeira apela à mobilização, à vitória e à fé, mas não apela a nada daquilo que nos últimos anos se tentou convencer os portugueses que devia ser a nossa aposta: a criatividade, a inteligência e a excelência, a educação e a formação, a qualidade e a beleza, o progresso e o bem-estar. Nem sequer à solidariedade, pois o fervor patriótico tem uma afinidade especial pela superioridade nacionalista, pela xenofobia e pelo racismo. A bandeira só define uma solidariedade depois de definir cuidadosamente a fronteira onde ela se esgota e se transforma em ódio. A bandeira não apela ao neocórtex mas ao cérebro primitivo, não apela à arte e à ciência mas à força e ao medo"?
Sabes porque não queria? Porque não posso concordar com esta frase, que vai brincar com os sentimentos ideológicos. Só uma mente ideologicamente comprometida (e não tenho problemas em dizê-lo, com os valores de esquerda) é que associa patriotismo com "afinidade especial pela superioridade nacionalista, xenofobia e racismo". Irrita-me solenemente quem assim pensa. É o mesmo que me chamarem racista porque sou monárquico e por isso defendo a minha nação. Ou dizer que todos os que defendem uma bandeira são uma cambada de bestas... Não aceito!
- Não achas curiosa e verdadeira esta frase: "É apenas triste que esta energia e esta mobilização não tenham tradução em nada de realmente importante, algo de que realmente nos pudéssemos orgulhar. É triste que aquilo em que acreditamos seja apenas isto em que podemos acreditar sem custo, seja esta mobilização que em nada nos compromete e nada nos exige senão beber cerveja e buzinar nas ruas"?
Concordo com ele
- Não achas curioso o "El Mundo" fazer um trabalho daqueles sobre os golos do Euro 2004 e não teres ninguém em Portugal que o faça?
- Não achas curioso que se fale de missão cumprida em jogos intermédios quando o que se procura num campeonato é ser capaz de ganhar a final, qualquer final, seja ela económica ou futebolística, sem desculpas como afirmar "missão cumprida" nuns oitavos-de-final? A missão está cumprida no fim, não no início!
Ambas as respostas vão para matérias relacionadas com critérios editoriais, definições de "opinião publicada"... deixemos para outras conversas.
- Não achas curioso Durão Barroso dar saltos com a vitória de Portugal numa bancada de futebol - de que não é responsável - e não o fazer para saltos qualitativos na economia ou na ciência ou na educação, onde é o responsável máximo?
Caro Pedro,
Como bem sabemos "a noticia é quando o homem morde o cão. Na área política, o que é bom com excepções é remetido para páginas menos nobres...
[act.: como é óbvio, e apesar de gostar de futebol, estou mais do lado deste "Portugal embandeirado": A sociedade civil está, agora, a resolver parte do problema: construir uma nova atitude que passa pelo abandono do distanciamento e da reverência solene e pela proximidade, a apropriação individual e a interiorização dos símbolos. A bandeira é de Portugal, mas, também, de cada um dos portugueses que a sentem como sua.
Era bom que a nova atitude perdurasse para além do futebol. E que Estado democrático encarasse o resto do problema.]
eu também, amigo, eu também!
- Não achas curioso as bandeiras nacionais aparecerem no mesmo fim-de-semana em que se ia votar para as europeias?...
A questão das bandeiras surgiu muito antes meu caro, pois no inicio da concentração já Scolari apelava às bandeiras nacionais. Mas é verdade que foi ao mesmo tempo da campanha.
- Não achas curioso as bandeiras nacionais aparecerem relacionadas com o futebol mas pedidas por um comentador político?
As bandeiras são claramente pelo futebol só que não foram por um comentador político qualquer: Marcelo Rebelo de Sousa tem um impacto que mais ninguém tem, numa televisão que acerta numa faixa do povo português que mais depressa responde a estes estimulos.
- Não achas curioso tu próprio falares de não misturar as coisas e dares o exemplo dos "movimentos colectivos onde seja facil de entrar e sem custos humanos" como o "branco por timor"?
Não acho curioso porque a minha tese reside exactamente ai: actualmente os cidadãos não se interessam por causas políticas de longo prazo, estruturadas e com definição ideologica. Respondem perante estimulos e reacções. Mais depressa consegues ter respostas positivas e em número significativo a eventos como "assina online a petição"; "manda um email pela XXXX" ou mesmo "vamos à manifestação" ou ainda "coloca lá um pano branco" do que um trabalho de longo prazo que evite essas acções: uma ida a uma assembleia municipal, uma reclamação contra uma câmara por causa de um prédio que vai abaixo e é património", etc. Esta questão das bandeiras entronca ai: fazes um apelo simplista e as pessoas ficam satisfeitas com o seu ego porque estão a apoiar o treinador.
- Não achas curioso um país a querer limpar a alma? Limpá-la de quê?
- Não achas curioso que não tenhas "desmontado" o texto do JVM?
Não queria: era um comentário, não era um texto elaborado.
- Não achas curioso e não és capaz de concordar com este parágrafo de que "A bandeira apela à mobilização, à vitória e à fé, mas não apela a nada daquilo que nos últimos anos se tentou convencer os portugueses que devia ser a nossa aposta: a criatividade, a inteligência e a excelência, a educação e a formação, a qualidade e a beleza, o progresso e o bem-estar. Nem sequer à solidariedade, pois o fervor patriótico tem uma afinidade especial pela superioridade nacionalista, pela xenofobia e pelo racismo. A bandeira só define uma solidariedade depois de definir cuidadosamente a fronteira onde ela se esgota e se transforma em ódio. A bandeira não apela ao neocórtex mas ao cérebro primitivo, não apela à arte e à ciência mas à força e ao medo"?
Sabes porque não queria? Porque não posso concordar com esta frase, que vai brincar com os sentimentos ideológicos. Só uma mente ideologicamente comprometida (e não tenho problemas em dizê-lo, com os valores de esquerda) é que associa patriotismo com "afinidade especial pela superioridade nacionalista, xenofobia e racismo". Irrita-me solenemente quem assim pensa. É o mesmo que me chamarem racista porque sou monárquico e por isso defendo a minha nação. Ou dizer que todos os que defendem uma bandeira são uma cambada de bestas... Não aceito!
- Não achas curiosa e verdadeira esta frase: "É apenas triste que esta energia e esta mobilização não tenham tradução em nada de realmente importante, algo de que realmente nos pudéssemos orgulhar. É triste que aquilo em que acreditamos seja apenas isto em que podemos acreditar sem custo, seja esta mobilização que em nada nos compromete e nada nos exige senão beber cerveja e buzinar nas ruas"?
Concordo com ele
- Não achas curioso o "El Mundo" fazer um trabalho daqueles sobre os golos do Euro 2004 e não teres ninguém em Portugal que o faça?
- Não achas curioso que se fale de missão cumprida em jogos intermédios quando o que se procura num campeonato é ser capaz de ganhar a final, qualquer final, seja ela económica ou futebolística, sem desculpas como afirmar "missão cumprida" nuns oitavos-de-final? A missão está cumprida no fim, não no início!
Ambas as respostas vão para matérias relacionadas com critérios editoriais, definições de "opinião publicada"... deixemos para outras conversas.
- Não achas curioso Durão Barroso dar saltos com a vitória de Portugal numa bancada de futebol - de que não é responsável - e não o fazer para saltos qualitativos na economia ou na ciência ou na educação, onde é o responsável máximo?
Caro Pedro,
Como bem sabemos "a noticia é quando o homem morde o cão. Na área política, o que é bom com excepções é remetido para páginas menos nobres...
[act.: como é óbvio, e apesar de gostar de futebol, estou mais do lado deste "Portugal embandeirado": A sociedade civil está, agora, a resolver parte do problema: construir uma nova atitude que passa pelo abandono do distanciamento e da reverência solene e pela proximidade, a apropriação individual e a interiorização dos símbolos. A bandeira é de Portugal, mas, também, de cada um dos portugueses que a sentem como sua.
Era bom que a nova atitude perdurasse para além do futebol. E que Estado democrático encarasse o resto do problema.]
eu também, amigo, eu também!
1 comentário:
O Notas de Aveiro não é responsável pelos comentários aqui escritos e assumidos pelos seus autores e a sua publicação não significa que concordemos com as opiniões emitidas. No entanto, como entendemos que somos de alguma forma responsáveis pelo que é escrito de forma anónima não temos pejo em apagar comentários...
Por isso se está a pensar injuriar ou difamar pessoas ou grupos e se refugia no anonimato... não se dê ao trabalho.
Não sabemos se vamos impedir a publicação de anónimos. É provável que o façamos. Por isso se desejar continuar a ver os seus comentários publicados, use um pseudónimo através do Blogger/Google e de-se a conhecer para notasaveiro@gmail.com.
João Oliveira
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João,
ResponderEliminaras bandeiras têm conotações seja na esquerda ou nos monárquicos (o JVM refere algumas mas eu até acho que há mais), o sentimento nacional COM a bandeira apenas se manifesta neste tipo de eventos (porque não se fez o mesmo para o 10 de Junho, por exemplo, que é apenas o dia de Portugal?)
Uma votação europeia dominada pela bandeira nacional - não achas contraditório? Não, porque foi pelo futebol...
Só mais uma nota sobre algo que não devo ter expressado correctamente: não é matéria editorial o exemplo do "El Mundo" porque foi dado para mostrar como se trabalha a sério; o exemplo da missão cumprida foi para mostrar como nos ficamos pelo meio sem acreditar no fim.
É o velho modelo do desenrascanço: se passarmos, porreiro, senão, já conseguimos ali chegar, foi bom, ponto final e pegamos todos nas bandeiras, fechamos as janelas e esperamos que daqui a quatro anos tenhamos mais sorte - quando a sorte constrói-se de oportunidades :(
Só para nos mantermos no futebol, não te lembras das greves em Saltillo, da mão com a França, da vergonha na Coreia? Tudo falhanços nossos e não dos outros. Por isso, sinceramente, espero que ganhemos este Euro para demonstrar como com trabalho difícil (Scolari dixit) é possível triunfar - não apenas no futebol mas em tudo na vida. Se perdermos, a culpa será dos outros que são apenas iguais a nós?...
Pedro