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segunda-feira, 19 de janeiro de 2004

Polis de Aveiro: “devolver a Ria à cidade” ou “expandir a cidade sobre a Ria”!



É preciso olhar com atenção para os projectos "Polis" pois serão as formas mais radicais de alteração do espaço habitado da cidade nos próximos anos. E foi com essa responsabilidade que Carlos Borrego, professor universitário, ex-ministro, e Teresa Fidelis, professora auxiliar, uma apaixonada da Ria (é sobre ela que fez a sua tese de doutoramento) se debruçaram sobre o tema:

Polis de Aveiro: “devolver a Ria à cidade” ou “expandir a cidade sobre a Ria”!

Face ao andamento do processo de concepção e de apreciação da intervenção Polis em Aveiro, a cidade poderá estar prestes a beneficiar de transformações importantes na sua relação com a Ria de Aveiro. Sendo inquestionável a qualidade da equipa responsável pelo projecto e mesmo do próprio projecto, vale a pena reflectir sobre os pressupostos e a natureza de intervenção, desmontando argumentos defendidos com frequência quando se trata da relação “Cidade-Ria”, em particular a expansão da cidade sobre a Ria.

No âmbito do debate público sobre o Polis houve quem defendesse a expansão urbana sobre a Ria de Aveiro como forma de a reutilizar e, consequentemente, valorizar. É verdade que a Ria de hoje não possui a vital relevância económica e social de tempos antigos. Actualmente resta aos Aveirenses apenas uma pequena ligação à Ria através da pesca artesanal, da produção de sal, da piscicultura e de alguma actividade turística. No entanto, mantém-se uma relação sentimental e nostálgica pela passada relação com a Ria, não decorrente de algum tipo de usufruto directo. Se é incontestável que a (necessária) revalorização pode passar pela promoção de novos usos da Ria, já não é crível que a construção e a habitação na área da Ria sejam uma solução a defender.

Hoje, a Ria já não é um elemento puramente natural, mas também o fruto da intervenção do homem ao longo de várias épocas. Mas a relevância ecológica e ambiental (CORINE, NATURA 2000, REN, ZPE) que lhe são atribuídas, e a consequente intenção de as proteger, não se legitima exclusivamente numa atitude fundamentalista de preservação de habitats naturais, mas antes, é complementada por uma valorização do peculiar (des)equilíbrio natural-humano. Por isto mesmo, novas intervenções humanas com o objectivo de reutilizar a Ria carecem de um particular cuidado sobre eventuais consequências. Construção, habitação, mobilidade, ruído, poluição, são apenas alguns tipos de intervenções que podem agravar o já frágil equilíbrio da interacção entre a cidade e a Ria.

Ora, apesar da natureza dos objectivos estratégicos apresentados na proposta de regulamento do PU Polis de Aveiro, onde se destacam “a qualificação das frentes de água, cujas marinhas e canais constituem uma singularidade ambiental e paisagística” e promoção de novas “práticas urbanas” que “fixem alguns equipamentos marcantes, ligados entre si pelos braços de água, arruamentos e estrutura verde”, a verdade é que propõem também a desanexação de uma parte importante da REN para a instalação de equipamentos e, sem clara fundamentação do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, a alteração do uso dominante a norte do IP5 (área perfeitamente qualificada do ponto de vista da funcionalidade ecológica) para passar a incluir habitação para além do limite tradicional na cidade.

Apesar da intervenção Polis ser explicada e justificada com base em argumentos ambientais, nem sempre aborda sistematicamente a complexa relação entre a cidade e a Ria funcionando mais como um projecto tradicional de desenvolvimento urbano, onde a componente imobiliária tem um peso excessivo. Está a negligenciar-se uma oportunidade para experimentar formas diferentes de implementar objectivos de política de ambiente atendendo à especificidade ambiental do território urbano de Aveiro. A redução de densidades existentes, e não o seu agravamento, a criação de mais espaços públicos verdes e soluções de eco-mobilidade, teriam enriquecido a intervenção. Ainda vamos a tempo, se vontade houver...

Comentem: a pergunta do titulo merece resposta...

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João Oliveira

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